20 julho 2009

o gosto dos outros 4

"Sua P.... do C... és uma V... ficas sempre a rir e ganhas sempre... Sua P..."

Mulher jovem num largo de Lisboa, Julho de 2009


Na quinta-feira à noite, assisti a um episódio de "faca e alguidar" ou de faca na liga, não sei bem como se diz. Lisboa de mão na anca estava ali no largo onde eu moro aos berros, a jorrar lágrimas de dor e de raiva que subiram em repuxo até ao meu terceiro andar, entupindo uma veia do coração da cidade. Um avc emocional em potência. Ali estava ao vivo um corpo de dor. Observei a cena sem pudor, de cima, com a distância física e o conforto de quem não faz parte da estória. Mas, sem saber bem porquê, senti humedecerem-se os meus olhos e o coração contraiu-se. Ali estava aquela mulher, pareceu-me bonita, bem arranjada, perto dos 30, ou talvez um pouco mais, a debater-se nos braços de um amigo que a tentava chamar à razão e devolver-lhe a dignidade sem sucesso. Enquanto isso, outra mulher, também ela bonita, pareceu-me, afastava-se em silêncio pela mão de outro homem. Nisto, o corpo de dor abateu-se sobre o chão e ali ficou uns bons momentos a sacudir-se ligeiramente, como se as últimas emoções vividas estivessem lentamente a dar de novo lugar ao verdadeiro ser que habita aquele corpo. Pareceu-me que era uma das histórias mais velhas do mundo: um homem e duas mulheres. Já todos conhecemos o argumento. E assim, na quinta-feira à noite, houve mais uma mulher que confundiu o que sente com aquilo que é verdadeiramente. Fosse ela boa ou má namorada (?), tivesse ela toda ou nenhuma razão, não sei nem me interessa, ela é seguramente um ser muito melhor do que aquele em que minutos antes se transformou pela corrente de emoções que as pobres células do seu corpo não souberam processar. E ela ficou entupida da cabeça aos pés, das mãos ao coração, com a alma submersa. A dor tem a força de uma maré viva e à onda que bateu na minha janela eu não soube o que fazer, molhou-me os olhos e eu devolvi-a sabendo que nada podia fazer por aquela mulher a não ser fechar a janela e voltar ao meu sofá. A dor é pessoal e a cura intransmissível.

Sem comentários: